terça-feira, maio 12

O Amor nos Tempos do Cólera

"(...) Sabia havia algum tempo que estava predestinado a fazer feliz uma viúva, e a ser feito feliz por ela, e isso não o preocupava. Pelo contrário: estava preparado. De tanto conhecê-las em suas incursões de caçador solitário, Florentino Ariza acabaria por saber que o mundo estava cheio de viúvas felizes. Ele as vira enlouquecer de dor diante do cadáver do marido, suplicando que as enterrassem vivas dentro do mesmo caixão para não enfrentar sem ele os azares do futuro, mas à medida que se reconciliavam com a realidade do seu novo estado ele as vira surgir das cinzas com uma vitalidade reverdecida. Começavam vivendo feito parasitas de sombra nos casarões desertos, viravam confidentes das criadas, amantes dos próprios travesseiros, sem nada que fazer depois de tantos anos de cativeiro estéril. Desperdiçavam as horas de sobra cosendo na roupa do morto os botões que nunca tinham tido tempo de pregar, passavam e tornavam a passar a ferro suas camisas de punhos e colarinhos de goma para que estivessem sempre perfeitos. Continuavam botando seu sabonete no banheiro, a colcha com suas iniciais na cama, o prato e os talheres em seu lugar na mesa, caso voltassem da morte sem avisar, como costumavam fazer em vida. Mas naquelas missas de solidão iam tomando consciência de que eram outra vez donas de seu arbítrio, depois de terem renunciado não só ao seu nome de família como à própria identidade, e tudo isso em troca de uma segurança que não foi mais do que mais uma de suas tantas ilusões de noivas. Só elas sabiam como pesava o homem que amavam com loucura, e que talvez as amasse, mas que tinham tido que continuar a criar até o último suspiro, dando-lhes de mamar, mudando-lhes as fraldas borradas, distraindo-o com historinhas de mãe para lhe aliviar o terror de sair de manhã e dar de cara com a realidade. E no entanto, quando o viam sair de casa instigado por elas próprias a enfrentar o mundo, então eram elas que ficavam com o terror de que o homem não voltasse nunca. Isso era a vida. O amor, caso houvesse, era uma coisa à parte: outra vida."
(Gabriel García Márquez, p. 250)